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Feiras artesanais recorrem a universo online para gerar renda durante quarentena

Edições de feiras virtuais, financiamento coletivo e divulgação em redes sociais são apostas; até terça-feira dia 7, ao menos dois desses 'eventos' tomam a internet para a venda de produtos

Por Marina Dayrell
Atualização:

Deixa-se para trás a proximidade das barraquinhas, a música ambiente e o programa familiar de visitar uma feira de produtos artesanais no fim de semana. No lugar, entram as redes sociais, as vendas online e a tentativa de explicar o artesanal pela tela de um dispositivo. A imposição do isolamento social pelo avanço do novo coronavírus no Brasil levou aos negócios artesanais, cujas rendas costumam depender majoritariamente de feiras, a preocupação de como sobreviver durante a pandemia. 

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A saída encontrada pela parceria entre o Espaço As Meninas Feiras e Eventos e a Charrua Produções Artísticas foi adiar uma feira presencial que ocorreria em março e levá-la para o espaço online. Desta sexta-feira, dia 3, até domingo, 5, cerca de 30 pequenos expositores, que vão da gastronomia ao artesanato, irão participar do SP Online

Diferente de um marketplace, que expõe produtos permanentemente e o cliente faz a compra quando quiser, a aposta dos produtores foi em delimitar dias e horários para o funcionamento da feira, como acontece nas edições presenciais. Por um link na página do Facebook, os interessados poderão ver os produtos, tirar dúvidas e realizar a compra diretamente com os expositores - que ficarão disponíveis para atendimento durante todo o horário de funcionamento.

“Muitos produtores fazem feira com frequência, então eles têm estoque. As coisas perecíveis se perdem e eles precisam vender. É uma alternativa para que a roda da economia gire, a gente mantenha a sanidade mental e escoe a produção”, explica Elaine Vilela, uma das idealizadoras do evento.

Uma das expositoras é a GeleiaBoa, produtora de geleias de frutas e chutneys artesanais da Serra da Mantiqueira. Regina de Araújo, dona da marca - que foi passada de mãe para filha - conta que 90% de suas vendas acontecem em feiras. 

“Elas são fundamentais para o nosso negócio. Nós fazemos degustações e apresentamos a nossa história para cada cliente e abrir mão desse contato pessoal é um obstáculo para as vendas”, destaca.

Produtos do e-commerce da Feira da Rosenbaum, que reviveu o site após o confinamento provocado pelo novo coronavírus. Foto: Julia Lego

A expositora conta ter sido pega de surpresa e, como a maioria dos negócios artesanais, não tem reservas financeiras. “A produção artesanal normalmente é feita em pequena escala, isto significa produção semanal e produtos frescos. Vendemos e fazemos novos e assim por diante. Não deu tempo de vender o que produzimos para sete feiras que estavam previstas e que foram todas canceladas. Isto significa a nossa falência.” 

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Para participar da SP Online, os expositores pagam entre R$ 50 e R$ 80 e não há cobrança sobre as vendas. Como forma de deixar o custo baixo, a produção optou por realizar o evento no Facebook. “Se usarmos plataformas que existem para feiras online, o custo fica muito alto e, neste momento, não pode ser caro para ninguém porque a preocupação com a economia é real.”

No ramo da gastronomia, a Feira Sabor Nacional também decidiu trocar, durante a quarentena, os espaços da Pinacoteca e do Museu da Casa Brasileira pelo ambiente virtual. Entre os dias 6 e 7 de abril, cerca de 20 expositores irão vender seus produtos em um link que será disponibilizado nas redes sociais da marca. 

“Vamos começar o primeiro evento com poucos expositores porque ainda é novo para a gente e tivemos que tomar atitudes rapidamente. A ideia é que ele dê certo para que a gente consiga fazê-lo com frequência”, conta Jose Roberto Giffoni, um dos idealizadores.

A compra será realizada pelo WhatsApp e os clientes, que devem morar na cidade de São Paulo, receberão os produtos em casa. O objetivo de realizar o evento nas próximas segunda e terça-feira é para que os compradores recebam os produtos a tempo de degustá-los, no final de semana, explica Giffoni. 

Estandes no Mercado das Madalenas, na edição de abril de 2019 realizada no gramado do Museu da Casa Brasileira, em São Paulo. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

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Financiamento coletivo e e-commerce 

Além de edições online, feiras já famosas na capital apostam em outros métodos para manter o fluxo de caixa de seus expositores. A Jardim Secreto, que leva 10 mil visitantes para cada evento que organiza no bairro do Bexiga, criou um financiamento coletivo. 

Com uma meta de R$ 50 mil de arrecadação, a campanha oferece kits de produtos dos expositores como recompensa aos doadores, com retirada a partir de junho. O valor, segundo a sócia Claudia Kievel, será compartilhado entre todos os 90 expositores - que vão de gastronomia a cosméticos -, além de cobrir o custo do espaço físico e do salário dos 12 funcionários. 

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“A meta é o mínimo para que a gente pague as contas até maio. O que estamos cobrando dos produtores é o mesmo valor que já cobramos nos espaços, média de 35%. Essa parcela não cobre um mês inteiro das nossas contas, mas estamos tentando cortar custos, como aluguel dos espaços, e negociar contas para serem pagas mais para a frente”, explica. 

Para garantir as contas a partir de junho, elas também apostam na venda virtual e entrega em casa. “Nunca fizemos nada online desse tamanho. Começamos com a ideia de fazer apenas o financiamento, mas, como ele estava indo muito devagar, aproveitamos que temos muitos produtos em estoque e passamos a fazer entregas”. 

No caso da Feira na Rosenbaum - focada em design - a alternativa foi reviver a plataforma de e-commerce, criada no ano passado e que ainda não havia sido muito usada. Com a quarentena imposta pelo coronavírus, a loja online passou a ser prioridade, ao lado de outras estratégias, como desconto promocional para a primeira compra e a criação de um canal de atendimento no WhatsApp.

A Jardim Secreto criou um financiamento coletivo para pagar salários de 12 funcionários e gerar renda para 90 produtores. Recompensas são caixas com produtos dos expositores. Foto: Gladys Tchoport

Divulgação e redes sociais

Criar um marketplace também era uma das metas para 2020 da Pop Plus, feira de moda plus size que reúne cerca de 100 expositores e 13 mil pessoas em São Paulo. Com uma edição marcada para março, a organização teve que adiá-la na véspera, após a Prefeitura de São Paulo determinar o cancelamento de eventos de massa. 

“A montagem já estava em pleno andamento, então nós e as marcas tivemos muito prejuízo. Por enquanto, por conta disso, não sei se vou conseguir investir em uma plataforma de marketplace, então temos usado a nossa comunidade nas redes sociais para divulgar os expositores”, explica a criadora da feira, Flávia Durante. 

A divulgação também tem sido a forma que a feira Mercado Manual encontrou para lidar com o período de quarentena enquanto não consegue montar uma estratégia maior. A marca teve que cancelar um evento que já estava marcado para o mês de março.

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“O que temos visto é que quem já tinha um braço online está investindo nisso. A nossa loja online estava sendo construída, estamos nesse processo. Mas, ao mesmo tempo, estamos receosos de fazer investimento nesse momento porque a nossa receita parou”, conta uma das idealizadoras da marca Daniela Scartezini. 

Por enquanto, ela e as sócias têm usado as redes sociais para divulgar os expositores e tentado pensar junto com eles sobre possíveis soluções. “A ideia é tentar construir um mercado online, mas é bem complexo porque a nossa experiência é na presença e no convívio. Estamos tentando entender, como negócio, como continuar girando.” 

Evento Pop Plus reúne marcas plus size na capital paulista. Foto: Robson Leandro 

Como organizar sua feira

A recomendação do Ministério da Saúde é o cancelamento ou o adiamento dos eventos. Mas, enquanto a rotina das feiras não volta ao normal, para quem tem interesse em divulgar seu negócio dessa maneira mais dinâmica, essa pode ser a hora de começar a se organizar.

Para Cecilia Arbolave, uma das criadoras da feira Miolo(s) - focada no mercado literário - o essencial para fazer um evento acontecer é ter tempo para pensar nos mínimos detalhes do acontecimento. 

“Geralmente, tem alguns meses de preparo, mas depende do formato da feira e do tamanho da programação. Mas com certeza vai alguns meses - de três a nove, eu diria. Nesse tempo, tem algumas coisas que são feitas, como abrir uma convocatória para as editoras e artistas independentes se candidatarem, além de pensar em questões de estrutura e produção.”

De acordo com Giuliana Isabella, professora de marketing do Insper (Instituto de Ensina e Pesquisa), os principais pontos de se fazer e participar de uma feira são relacionados ao conhecimento e networking. O ponto de partida, de acordo com ela, é saber o tema da feira ou evento e entender por que as pessoas iriam até a feira.

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“Não pode ser algo muito geral, senão as pessoas se perdem. Sabendo disso, o primeiro ponto é verificar o tamanho da demanda em número de empresas que teriam interesse em participar dessa feira. Essa informação vai ajudar a estimar tamanho e localização. Além de todos os outros pontos, como preço de entrada, se vai ser cobrado ou não, valor que será cobrado dos estandes e mais. Tudo isso depende dessa demanda de quem vai estar na feira e do público final”, explica.

Imagem do livro 'CRASH!', uma das criações de Morris Cox Foto: Gustavo Piqueira/Lote 42/Divulgação

“E quando falamos do público final, não precisa necessariamente um número muito alto, mas uma quantidade que tenha certo poder de negociação”, acrescenta. Ainda sobre este tópico, Giuliana acrescenta: “Pensando no público alvo desta feira, você tem uma estimativa de tamanho, de como as pessoas vão chegar, se precisa ter acesso fácil ao transporte público ou se precisa ter um espaço bom de estacionamento, porque tudo isso faz com que as pessoas desistam ou não de ir. O melhor local para realizar o evento sempre estará relacionado ao público”.

E como ganhar dinheiro com esses eventos? Geralmente, cobra-se uma taxa de inscrição ou uma porcentagem sobre as vendas. Inara Corrêa Prudente e Mônica Isnard, idealizadoras do Mercado das Madalenas, que desde 2012 reúne marcas que tenham produtos autorais e feitos de modo artesanal na capital paulista, lucram com as vendas, cobrando uma comissão dos expositores. Durante o evento, que geralmente acontece no Museu da Casa Brasileira, na zona oeste da cidade, cerca de 6.000 pessoas passam pelo local no final de semana.

“Somos bem rigorosas com a qualidade e astral do expositor. Prezamos muito pela boa energia entre todos envolvidos na feira”, diz Inara. Para isso acontecer, a dupla demora cerca de três meses para organizar as edições. “E mais uns 15 dias para finalizar.”

O reflexo inicial do retorno será medido de acordo com o sucesso deste evento. “Então, quando uma feira é bem-sucedida, sai em mídia espontânea, tem repercussão na internet, outras empresas ou outros temas aparecem e as pessoas acabam se interessando em montar uma feira com esse organizadores em que tudo deu certo”, diz Giuliana. 

E finaliza: “Não é só um benefício financeiro [para o organizador], mas de imagem também”.

Colaborou Bárbara Silveira, Especial para o Estado

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