Publicidade

Compras coletivas ajudam pequenas empresas na redução de custos

Divisão de espaço de produção, compra conjunta de matéria-prima e logística de entrega ajudam empreendedores a superar crise e criar novos negócios

PUBLICIDADE

Foto do author Ludimila Honorato
Por Ludimila Honorato
Atualização:

Ressignificar. Foi isso o que pequenos empreendedores fizeram, por força da pandemia, para manter suas empresas de pé durante a crise. Eles encontraram novos jeitos de vender, de estar perto do cliente e de manter as contas em dia. Pensando na redução de custos sem comprometer a qualidade do serviço, alguns donos de negócios de alimentação se uniram para dividir espaços de trabalho e fazer compras coletivas.

PUBLICIDADE

De longe, as estratégias parecem mais do mesmo; porém, um olhar atento revela o sentido de ajuda mútua, impulsionada por um momento como esse, da pandemia do coronavírus, em que somar forças faz mais sentido do que lutar sozinho.

“Estava falando com minha sócia sobre a importância disso para micro e pequenos empreendedores. Estamos passando por essa necessidade no momento em relação a ferramentas que poderiam ser compartilhadas”, comentou Felipe Antonio no grupo do Estadão sobre carreira e empreendedorismo no Telegram.

Ele tem uma escola de idiomas que atende empresas e acredita que seria proveitoso compartilhar com outros negócios alguns softwares, como de assinatura de contratos, gestão de equipes e projetos. A reportagem perguntou aos integrantes da comunidade, donos de negócio, se eles haviam se unido a outros para realizar compras conjuntas e reduzir custos. De 38 votos, apenas 24% disseram sim.

As sócias responsáveis pela confeitaria Toasty encontraram um caminho de compartilhamento. A cozinha que elas utilizam apenas durante o dia foi oferecida para o chef de cozinha Fernando Vessoni iniciar o Mordiscadas, que serve no período da noite. Enquanto ele teve de investir muito menos do que teria se tivesse de começar do zero, elas criaram uma nova possibilidade de renda. Os três também compram juntos os insumos que servem aos dois empreendimentos, como itens de hortifrúti e embalagens.

“Quando o Toasty fechou (pelas medidas sanitárias de restrição), nossa maior questão era o custo fixo, tínhamos de achar uma forma de conseguir pagar sem o movimento de antes. Minha sócia tinha um amigo que tinha postergado planos, então fizemos esse acordo de ele usar a cozinha à noite”, conta Patrícia Escobar.

O chef Fernando Vessoni, à frente do Mordiscadas, Silvia e Patrícia, que comandam o Toasty,fizeram uma parceria tanto para divisão de espaço da confeitaria quanto para fazer compras de insumos que servem para os dois estabelecimentos. Foto: Alex Silva/Estadão

Ela classifica o acordo mais como uma parceria do que uma locação do espaço. “A gente tem uma participação na venda dele e faz uma conta de quanto custa para ele estar aqui”, explica. “Temos acordo de comprar produtos juntos. É uma ajuda no nosso custo”.

Publicidade

Além das questões financeiras, a divisão se baseia também no aspecto da colaboração. “É muito legal poder ajudá-lo a começar, pois temos uma estrutura que está parada e ele tem a oportunidade de começar sem precisar de um grande investimento.”

Para Fernando Vessoni, que já trabalhou em restaurantes nacionais e internacionais, o Mordiscadas só existe porque a Toasty existe. “A sócia da Patrícia estudou comigo na faculdade e fez a proposta. Criamos o projeto juntos”, conta ele, que estava prestes a sair do Brasil quando a pandemia começou.

A ideia veio em momento oportuno, porque o chef não tinha planos no País, a crise dificultou a busca por recolocação e o negócio servia ao contexto: totalmente por delivery. Ele decidiu começar com sanduíches, passou a fazer entradas e vai iniciar com especiais de curry, aplicando o que aprendeu em viagens pelo sudeste asiático.

Vessoni conta que, como a Toasty já tinha o espaço para ceder, o investimento dele na estrutura foi baixo. Isso facilitou para gerar um fluxo de caixa inicial e investir melhor em outras áreas. O chef também vende as sobremesas produzidas pela confeitaria e um negócio divulga o outro. 

Parcerias demandam organização

Fazer compras coletivas, alugar um espaço em uma grande cozinha coletiva e o modelo de coworking já se mostravam como tendência. A pandemia impulsionou essas estratégias, mas, quando se trata de pequenas empresas, nem tudo é de caso pensado.

“Começamos com alguns eventos e emprestando o espaço para dar uma força no projeto dos meus cunhados, que estavam sem ponto. Mas as coisas foram crescendo e culminou nessa parceria”, relata Talita Silveira, à frente do Make Hommus, que agora divide espaço com o Boteco Meio Fio, de cervejas artesanais.

Publicidade

Para ela, compartilhar o espaço, as contas e o trabalho é algo que tem se mostrado eficiente, porque são modelos de negócio que se complementam. “Mas, claro, tudo precisa ser avaliado. Dividir nunca é fácil. Cada um tem seu estilo de trabalho, sua forma de atender. Às vezes, acaba gerando um atrito aqui, outro ali.”

Segundo Talita, a parte de divisão de contas é mais complicada e tudo precisa estar muito bem detalhado. “Acho que a gente se entende bem em tudo.” Semelhante ao Toasty e ao Mordiscadas, o público que compra um hommus aproveita para levar um chope e vice-versa.

Guilherme Fowler, professor de estratégia do Insper, avalia que, mesmo com a ressignificação de modelos, há características essenciais que permanecem. “Sempre que a gente olha para a compra coletiva, tem coordenação interna. Com a pandemia, é superdifícil, mas a ideia é ‘vamos deixar a diferença de lado um pouco e nos ajudar’.”

E a dica é fazer parcerias entre negócios que estejam minimamente relacionados. “Quanto mais heterogêneo são os empreendedores, maior a chance de dar errado. Mas, eventualmente, a pandemia atenua esse efeito”, destaca.

Parceria mesmo com possível concorrência

Exemplo que deu certo é o Amo-te Sando, comandado por Toshi Akuta, que divide a cozinha do Pandaya Dumpling, do chef Victor Wong. Ambos são da culinária asiática, trabalham juntos e dividem custos. Antes dessa união, Akuta fazia os sanduíches japoneses em casa, mas sentia necessidade de uma cozinha profissional. “Foi quando surgiu a parceria com o Victor, de pagar uma mensalidade e dividir a cozinha com ele. Sem essa parceria, seria muito difícil estar onde estou hoje”, conta Akuta.

Embora faça sentido buscar parcerias com empreendimentos semelhantes, a ideia de estar se unindo ao seu “concorrente” pode minar as possibilidades de economia. Danilo Fortunato, diretor do e-commerce Chocolata, conta que esteve diante de uma oportunidade para reduzir custos, mas a oferta foi rejeitada pela outra empresa.

Publicidade

“O próprio fornecedor informou que nosso concorrente também tinha um pedido e que poderia fazer o envio dos produtos deles com os nossos, o que acarretaria num frete mais barato para todos. A proposta foi negada pela nossa concorrente sem muita explicação. Uma pena”, lamenta. De outra forma, ele conseguiu, junto a seus fornecedores, discutir preços, aluguéis e demais insumos para ficar melhor para todos. “Nós e nossos parceiros atuamos de forma muito rápida e conseguimos reduzir custos e repassar para nossos clientes.”

Thiago Albuquerque divide com outra padeirao frete da farinha que usa nos pães da Tasca Nossa Padaria. Foto: Acervo pessoal

Para Fowler, ter uma associação entre competidores não é um problema e, no contexto de pandemia, entre pequenas empresas, haveria mais benefícios do que prejuízos. “A compra coletiva gera poder de compra e desconto, tem troca de conhecimento tácito e ela se presta nessa ideia da rede de apoio.”

Foi assim com Thiago Albuquerque, autor dos pães da Tasca Nossa Padaria. Quando a demanda aumentou, ele precisou comprar uma saca maior de farinha, mas ou o frete não compensava ou a quantidade mínima necessária para reduzir o valor era muito grande para um negócio pequeno. “Conversando com uma padeira sobre o forno que comprei, ela disse que conhecia outra padeira que usava a mesma farinha que eu. Nesse contato, vi que eu pagava caro, então ela sugeriu comprar uma saca a mais para mim e a gente divide o frete.”

Desde julho do ano passado, os dois se ajudam na compra de outros produtos, mas a farinha é o item principal. A essa relação somam-se a indicação mútua para a venda dos pães e a troca de informações sobre melhores produtos e experiências sobre panificação. Se ele está preocupado em lidar com a concorrente? “Sempre vai ter concorrência, mas principalmente em São Paulo, cidade muito grande, dificilmente uma pessoa vai sempre no mesmo lugar. Quanto mais se juntar a outros padeiros, mais você divulga o seu produto.”

Quer debater assuntos de Carreiras e Empreendedorismo? Entre para o nosso grupo no Telegram pelo link ou digite @gruposuacarreira na barra de pesquisa do aplicativo. Se quiser apenas receber notícias, participe da nossa lista de distribuição por esse link ou digite @canalsuacarreira na barra de pesquisa. 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.