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Aliança com pequenos produtores reforça cadeia da cerveja no RS

Cervejaria Salva fomenta a produção do lúpulo local, enquanto a SteinHaus se alia a uma cooperativa de produtores orgânicos e deslancha como primeira cervejaria orgânica do País

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Foto do author Ludimila Honorato
Por Ludimila Honorato
Atualização:

O tour cervejeiro pelo Rio Grande do Sul revela a união de forças entre as cervejarias e pequenos agricultores. Enquanto o fomento ao trabalho na terra estimula a melhoria do produto e abre oportunidades para a agricultura familiar, o consumidor pode encontrar nas gôndolas mais possibilidades de sabores, autenticidade e maior qualidade da bebida.

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Quando a cervejaria Salva foi idealizada, a proposta era “salvar o que as cervejarias nunca deveriam ter deixado de ser”, diz o fundador João Giovanella. No caso, era usar insumos locais, manter a circulação de dinheiro na região e salvar a cadeia produtiva. Foi daí que surgiu o projeto do lúpulo gaúcho, que busca incentivar o plantio local.

“É uma quebra de toda uma verdade que se falava sobre isso”, comenta Roger Klafke, especialista em alimentos e bebidas do Sebrae-RS. Segundo ele, dizia-se ser impossível plantar lúpulo no Brasil. O resultado dessa descrença é que a produção brasileira não representa nem 1% do mercado, tornando as cervejarias dependentes da importação. Mas, no mercado mundial, o País não tem prioridade de compra, diz o engenheiro agrônomo Marcus Outemane, da Salva.

João Giovanella, fundador da Salva Craft Beer, cervejaria de Bom Retiro do Sul/RS. Foto: Marcos Nagelstein

“Nunca vamos ter o melhor e o mais fresco, a gente recebe lúpulo de duas safras atrás, pelo menos”, afirma ele. Mas iniciativas do setor e do próprio governo estadual incentivam o plantio para cervejarias e microcervejarias locais, que visam produtos mais frescos e de circulação regional.

A estratégia de crescimento regional e nacional da Salva, no entanto, é apoiada agora pelo compromisso de investimento firmado no começo deste mês com a Silo Food Co. SA, investida da gestora de private equity VSK Capital, dos EUA. O acordo prevê a aquisição de 40% do capital da cervejaria, cujo valor será investido para ampliar em até cinco vezes a capacidade de produção da fábrica atual.

Parceria no lúpulo

Desde o início da fábrica, em 2016, Giovanella começou a cultivar lúpulo, mas a produção ainda é pequena. Por meio do projeto Salva Hops, a cervejaria de Bom Retiro do Sul quer trazer pequenos produtos para um convênio. Atualmente, são sete agricultores plantando o lúpulo usado pela empresa nas receitas. “A ideia é ter uma central de beneficiamento que nos permita fomentar mais”, planeja ele.

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No ano passado, a Salva adquiriu um terreno para ampliar a produção de lúpulo na região, que será um negócio à parte da cervejaria. Mas, enquanto a terra ainda é preparada, os produtores parceiros são acompanhados de perto. “Damos toda assistência técnica e garantimos a compra”, diz Outemane, que vê o insumo nesse tipo de cadeia como a diversificação, não único foco de interesse da propriedade.

Cervejaria Salva firmoucompromisso de investimento com investidor dos EUA para ampliar a capacidade da fábrica. Foto: Marcos Nagelstein

Tanto que, em uma das fazendas, a família cria vacas leiteiras e há um incentivo na busca por outras vertentes. Chega a ser um critério para o engenheiro agrônomo na hora de selecionar com qual produtor trabalhar. “A gente procura esse perfil de empreendedor rural, que busca alternativas diferentes ao que tem hoje na propriedade.” Com o resultado da parceria, em 2021, sete cervejas foram produzidas com insumo local.

O lúpulo também vem como uma alternativa para os produtores de tabaco, outro produto forte no Estado, em especial na cidade Venâncio Aires. “Tem muitas famílias querendo desesperadamente alternativas ao tabaco por causa da questão do inseticida”, diz Giovanella, que atualmente preside a Associação Gaúcha de Microcervejarias, sobre o cenário para avançar com o lúpulo gaúcho.

Cervejaria orgânica e cooperativa

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É no município de Picada Café que se encontra a primeira cervejaria orgânica do Brasil, a SteinHaus. Aliada à Coopernatural, cooperativa de produtores orgânicos composta por 75 famílias, a empresa aposta em cervejas com café, naturalmente sem glúten, sem álcool, com mel, além de vinhos.

O proprietário Ricardo Fritsch encontrou um produtor agroecológico de cevada em Santo Antônio do Palma em 2014. Com os grãos obtidos, começou a fazer testes e, em novembro do ano seguinte, lançou a primeira cerveja orgânica. Apesar de ser um mercado desafiador, é um copo cheio para os pequenos negócios – além de comprar insumos de produtores menores, a cervejaria vende para empórios de menor porte também.

Cervejaria orgânica SteinHaus, localizada na cidade de Picada Café, tem rótulos sem álcool e naturalmente sem glúten. Foto: Marcos Nagelstein

“A grande indústria não têm interesse em fazer logística para as menores, percebo que é um nicho que eles nem querem tanto ocupar. (Para nós) fica muito fácil comercializar”, diz o empreendedor, que também é diretor-presidente da Coopernatural. Além de servir à cadeia da cerveja e do vinho na SteinHaus, a organização tem o Sudeste do Brasil como maior mercado consumidor, com produtos como pipoca, geleias e sucos.

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“Movimentamos diversas economias em vilas menores”, orgulha-se Fritsch. “Essa diversidade dentro da cooperativa favorece explorar o mundo da cerveja de forma maior e agradar muitos consumidores.” Ele diz que, com o tempo, a Coopernatural criou interfaces com grupos agroecológicos de outros Estados e com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o que permitiu ampliar a atuação.

Stein Haus utiliza ingredientes de pequenos produtores orgânicos nas receitas de cervejas e vinhos. Foto: Marcos Nagelstein

Quanto ao lúpulo usado na cervejaria, importado da Alemanha e Nova Zelândia, ele garante a origem orgânica por meio de uma certificação do país produtor. No Brasil, a chancela não vale, mas a legislação daqui permite a utilização de matéria-prima não orgânica em quantidade não superior a 5% em peso, e é aí que se enquadra o insumo estrangeiro.

O conceito ecológico se estende agora ao restaurante da SteinHaus, inaugurado em abril deste ano. “É mais um desafio que estamos trabalhando para superar. Nós plantamos, produzimos, colhemos, selecionamos, separamos, fracionamos, rotulamos, deixamos na caixa e enviamos para o consumidor. Industrializamos a cerveja e temos agora um espaço para o consumidor nos visitar”, se alegra Fritsch.

A repórter viajou a convite do Sebrae

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