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País tem alto potencial de negócios em reciclagem, mas aproveita pouco

Estudo feito pela Artemisia e Gerdau mapeia as oportunidades para se empreender no setor com inovação e tecnologia; Brasil aproveita só 4% dos materiais recicláveis

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Por Bianca Zanatta
Atualização:

Maior gerador de resíduos da América Latina, o Brasil aproveita apenas 4% dos materiais recicláveis – pouco perto de países como Chile, Argentina e África do Sul que reaproveitam em média 16% dos materiais e da Alemanha, 67%. Diante dessa disparidade, a ONG Artemisia mapeou desafios, tendências e boas práticas na área de reciclagem, dando origem ao trabalho intitulado “Tese de Impacto Socioambiental em Reciclagem”.

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O resultado trouxe as 13 principais oportunidades para empreender com inovação e tecnologia no setor. Feito em parceria com a gigante Gerdau, maior fabricante de aço do País e também a maior recicladora de sucata da América Latina (73% do aço que produz é feito a partir desse material), o estudo aponta caminhos que podem contribuir para acelerar as mudanças necessárias em direção a uma economia circular.

Entre os exemplos listados estão desde negócios que atuam na gestão de resíduos sólidos em condomínios ou em lugares de difícil acesso até aqueles ligados à educação do consumidor para a reciclagem. Também inclui soluções para melhorar as condições de trabalho e aumentar a renda dos catadores. A tese analisa ainda oportunidades de empreender na regularização, gestão e eficiência de cooperativas de reciclagem; na criação de métodos inovadores; e no desenvolvimento de ferramentas de rastreabilidade e logística reversa eficiente, entre outros.

Negócios mapeados vão desde gestão de resíduos até soluções para melhorar a renda dos catadores. Foto: Igor Miranda

Diagnóstico

“O País tem graves problemas sociais e ambientais que podem ser resolvidos pela ótica dos negócios, de forma complementar à atuação do Estado”, afirma Luciano Gurgel, diretor executivo da Artemisia. “Mas isso só dá para fazer por meio de um diagnóstico. A tese funciona como um raio X do setor para encontrar os gargalos”, explica. 

Uma das principais constatações do estudo, segundo ele, é o desafio da última milha – o caminho do consumidor ou da empresa que descarta o resíduo até a indústria que vai reciclar. “Hoje essa é muitas vezes a única fonte de renda para pessoas das camadas mais baixas da população, que trabalham como catadoras de lixo. Negócios que fazem o elo entre essas pessoas e os grandes geradores de resíduos criam uma excelente oportunidade de geração de renda”, afirma.

Para o líder de responsabilidade social da Gerdau, Paulo Boneff, a reciclagem é um setor com potencial de movimentar um grande volume de empregos. Para isso, no entanto, é essencial que todos os elos da cadeia funcionem. “Não acredito que tenha uma bala de prata, mas o grande fator de sucesso é o trabalho em rede, conectado”, afirma ele. “Não dá para os setores público e privado e o terceiro setor agirem individualmente. O Brasil precisa de soluções multiplicáveis”, reforça, ressaltando a importância da participação da pessoa física nesse elo. 

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Recompensas

Entre as oportunidades mapeadas pela tese, Boneff destaca os programas de incentivo em parceria com a sociedade civil como uma forma inovadora de conscientizar e fazer com que o consumidor seja um ator no processo. São startups como Triciclo, Molécoola e So+ma, que engajam as pessoas a separar os recicláveis e fazer a destinação correta por meio de sistemas de recompensa.

No caso da So+ma, o cliente cadastrado leva seus resíduos limpos para os pontos de coleta da empresa e ganha pontos que podem ser trocados por benefícios como exames, alimentação básica, experiências, descontos em supermercados e cursos de capacitação profissional. Além de incentivar a mudança nos hábitos, a ideia é ampliar as oportunidades nas comunidades de baixa renda. 

“Num País onde a desigualdade é alta e as oportunidades são escassas, foi a forma que encontrei para empoderar pessoas que não tiveram acesso à educação”, afirma a fundadora da startup, Claudia Pires. “A ideia era não só ter um impacto positivo da perspectiva do ambiente, do catador e da cooperativa, mas expandir o olhar social como benefício da população em geral”, destadca ela, explicando que 300 usuários já fizeram cursos através do programa. São pessoas, segundo ela, que não teriam o mesmo acesso por falta de condições financeiras – e foram os pontos conquistados pelo hábito da reciclagem que possibilitaram a conquista.

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A empresa, que já atua em Curitiba, Salvador, Goiânia e Camaçari, fez ainda uma parceria para instalar seus contêineres em escolas públicas de São Paulo, onde o debate sobre reciclagem e educação financeira. “As crianças aprendem desde cedo como aquela atitude que está tendo impacto negativo pode se tornar um impacto positivo”, conta a empreendedora. 

“Além de conseguir ver na prática, com dados materializados, a diferença que faz a médio e longo prazo, uma criança que nunca teve uma bola e ganha uma em troca dos pontos consegue ver que ela pode, que ela tem uma escolha”, conclui.

Treinamento em casa

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Outro negócio de impacto que foca não apenas na gestão dos resíduos, mas na educação das pessoas para a reciclagem, é o Instituto Muda, que implementa a infraestrutura para coleta seletiva em condomínios, oferece um aplicativo com plano de fidelidade para ganho de benefícios e cuida de toda a logística de retirada e transporte dos resíduos até cooperativas de reciclagem de baixa renda. 

Segundo o fundador Alexandre Furlan, que desenvolveu o projeto do Muda quando cursava gestão ambiental, o programa de educação dos moradores e funcionários dos condomínios é o coração da empresa. “As pessoas querem fazer a separação dos materiais, mas não têm instrução. São dúvidas básicas, como se a caixa de pizza engordurada é reciclável ou não”, exemplifica.

Alexandre Furlan, fundador do Instituto Muda, negócio de impacto que foca não apenas na gestão dos resíduos, mas na educação das pessoas para a reciclagem. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Ele conta que o programa se dá em três etapas. Na primeira, os funcionários do prédio são instruídos; depois há um treinamento noturno de 15 minutos com os moradores, de andar em andar; em terceiro lugar é feito um treinamento com diaristas e funcionários domésticos, para então a coleta se iniciar. 

O projeto e o contêiner são patrocinados por empresas parceiras, que passam a ser certificadas pelo Selo Muda Recicla – são mais de 15 grandes marcas, como Natura, Ambev, Vigor, iFood e Colgate.

O condomínio só paga pela coleta, que pode ser uma mensalidade de R$ 12 por apartamento ou de R$ 600 mensais fixos em prédios com mais de 60 unidades. Atualmente a startup atua em mais de 600 condomínios, garantindo a destinação correta de 600 toneladas de materiais recicláveis por mês e a renda de 900 famílias ligadas às 16 cooperativas que o projeto alimenta.

O trabalho com os catadores de materiais também tem criado negócios para ajudar na orientação dos trabalhadores. É o caso do Cataki, onde os profissionais se cadastram em um aplicativo, informando a região onde atuam e que tipos de resíduos coletam para gerar um perfil profissional. 

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