PUBLICIDADE

Refugiados empreendedores ganham plataforma para divulgar negócios

ONU lança espaço digital para estimular vendas de refugiados; outras iniciativas ajudam a romper barreiras sociais apoiando produtores amazônicos, mulheres, negros e transgêneros

Por Victoria Netto
Atualização:

Começar um empreendimento do zero é sempre um desafio, principalmente para quem abandonou o país de origem em um contexto de crise para fixar raízes em terras estranhas. É o caso de quase 55 mil refugiados reconhecidos no Brasil, boa parte profissionais liberais, que agora contam com uma plataforma digital voltada à divulgação de seus empreendimentos, a Refugiados Empreendedores. A partir desse espaço digital, eles podem receber apoio não só de consumidores locais, mas também de empresas.

PUBLICIDADE

Lançada neste mês pela Agência da ONU para Refugiados (Acnur) em parceria com a Rede Brasil do Pacto Global, a plataforma busca dar visibilidade a pequenos empreendedores que foram acolhidos no País. A iniciativa ainda reúne informações sobre cursos e mentorias, além de oportunidades de acesso ao microcrédito. 

“Muitos refugiados tiveram a vida afetada durante a pandemia do coronavírus, então percebemos que havia a necessidade de fazê-los conhecidos nas comunidades onde estavam inseridos e vimos uma forma de aumentar seu alcance por meio da plataforma digital”, explica ao Estadão o oficial de meios de vida da Acnur, Paulo Sérgio de Almeida, que coordena a equipe responsável pela gestão de conteúdo da plataforma.

Para participar, o refugiado precisa preencher um formulário na plataforma, e a equipe responsável entra em contato para registrá-lo. Até agora, 57 negócios de nove nacionalidades estão cadastrados, 70% deles liderados por mulheres. Os segmentos vão desde marcenaria, design, artesanato, maquiagem, moda e produção gráfica até o setor mais recorrente: gastronomia.

A colombiana Liliana Patrícia Pataquiva Barriga, de 42 anos, dona do restaurante Arepas Urbanika, é uma dessas empreendedoras. Ela, o marido e os dois filhos chegaram ao Brasil em 2014, fugindo de ameaças de narcotraficantes em Bogotá. Mas foi só em 2016, já mais adaptados, que o casal criou o próprio negócio para vender arepas, prato típico da Colômbia.

De uma food bike a um food truck em eventos itinerantes, a empresária resolveu apostar em um espaço maior em 2020. Foram anos de sonho e meses de negociação para estabelecer o Arepas Urbanika na Vila Madalena, em São Paulo. Liliana assinou o contrato e, três dias depois, veio a pandemia. 

A colombiana Liliana Patrícia Pataquiva Barriga, dona do restaurante Arepas Urbanika, é uma dessas empreendedoras da plataforma; o negócio foi criado em 2016. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

“Já começamos só com delivery, portas fechadas e um serviço bem diferente do que tínhamos pensado”, conta ela. “Procuramos a Acnur para ajudar na divulgação, mostrar que o restaurante existe, que estamos abertos, que temos um ponto fixo.”

Publicidade

Hoje, além de serviços de entrega por aplicativo, ela e o marido já atendem alguns clientes no salão e servem cerca de 30 pedidos no almoço — número que, apesar de crescer, ainda é menor que os 100 atendimentos realizados antes da pandemia. 

Para Paulo Sergio de Almeida, oficial da Acnur, incentivar esses empreendedores é importante não só para reforçar sua renda, mas também para o contexto em que estão inseridos. 

Arepa, prato típico da Colômbia, preparada por Liliana Barriga; lanchonete da empreendedora é um dos negócios que faz parte do marketplace. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

“Há todo um fluxo financeiro em torno desses negócios que movimenta as economias locais. Se de um lado a prosperidade é importante para esses empreendedores, de outro eles também crescem, contratam pessoas, trazem diversidade e deixam suas marcas nas regiões. É um ganha-ganha.”

AmazoniAtiva e a produção regional

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

O fortalecimento da produção local também é o mote da AmazoniAtiva. O portal, criado pelo Instituto BVRio em parceria com entidades como a Força-Tarefa de Governadores Pelo Clima e Florestas (GCF Task Force), funciona como uma vitrine para pequenos empreendedores amazônicos, famílias de produtores, associações indígenas, quilombolas e agroextrativistas.

“O nosso lema é conectar pessoas, floresta e mercados, para ampliar o acesso de produtos e ativos da Amazônia brasileira a nichos específicos, com alto valor agregado e contribuição para a manutenção da floresta em pé”, explica o diretor de Relações Institucionais da AmazoniAtiva, Beto Mesquita. 

O portal, lançado em 2019 como um piloto em Rondônia, tinha 18 empreendimentos. Em setembro de 2020, quando a plataforma passou a abranger os nove Estados da Amazônia Legal, o número saltou para 60. De lá para cá, cerca de R$ 100 mil foram movimentados em vendas e parcerias comerciais. 

Publicidade

Ainda não é possível comprar os produtos na plataforma, que tem previsão para virar um e-commerce no primeiro semestre deste ano. Mas a partir dela o consumidor pode fazer encomendas entrando em contato com os produtores.

A Saboaria Rondônia, pequena indústria de cosméticos gerenciada por produtoras rurais, está na AmazoniAtiva desde o começo da plataforma. Para Mareilde Freire de Almeida, de 59 anos, sócia-fundadora da Saboaria, a vitrine ajuda a diminuir um dos maiores gargalos: a dificuldade de vender o que é produzido.

As sócias-fundadoras da Saboaria Rondônia (da esq. à dir.)Maria Jaqueline Freire Tavares, Rosely Freire de Almeida e Mareilde Freire de Almeida. Foto: Larissa Fernanda Nogueira Venancio
Em altaPme
Loading...Loading...
Loading...Loading...
Loading...Loading...

“Os produtores e extrativistas amazônicos ficam isolados. Estamos no Norte e temos mais dificuldades logísticas. Vemos outras regiões trabalhando a biodiversidade amazônica, feita até de forma exploratória, comprando os insumos amazônicos a preços baixos e fazendo essa venda em outras regiões”, comenta Mareilde.

A preservação é outro eixo do trabalho desses empreendedores. “Nós trabalhamos com a extração e a defesa de duas palmeiras da região, o babaçu e o buriti, fazemos a coleta dos frutos, a extração dos óleos e trabalhamos com a devolução dessas sementes para que elas possam se tornar mudas.”

Cada ativo dos cosméticos da Saboaria Rondônia — cacau, café, óleo de copaíba, mel — vem de produtores e cooperativas da região de Ouro Preto do Oeste (RO). Para a empresária, “a união dos pequenos” é importante para ajudar a romper essas barreiras.

Marketplaces para mulheres, negros e trans

As iniciativas que apoiam empreendedores refugiados ou isolados regionalmente têm correlatos em plataformas para outros grupos politicamente minorizados. A Rede Mulher Empreendedora (RME), o Mercado Black Money e o EmpoderaTrans, por exemplo, dão visibilidade a mulheres, negros e pessoas trans.

Publicidade

O Mercado Black Money é um marketplace que permite a conexão entre empreendedores e consumidores negros. “Ao longo de nossa jornada, percebemos que há muitos brasileiros desejando combater o racismo por meio do apoio a negócios negros, mas não sabiam como encontrar esses afroempreendedores”, explica Nina Silva, sócia-fundadora do Movimento Black Money.

Criado em março de 2020 com um piloto de 30 lojas, o marketplace exclusivo para empreendedores negros já soma mais de 800 lojas sem mensalidade. Destas, 70% são encabeçadas por mulheres nas áreas de moda, infoprodutos e educação.

O projeto tem abrangência nacional, e o ticket médio por consumidor fica em torno de R$ 120, em um mercado de nicho que movimenta R$ 1,9 trilhão por ano, segundo Nina.

Na mesma linha, a Rede Mulher Empreendedora criou, em 2019, um marketplace para auxiliar mulheres na geração de renda e na divulgação de seus negócios. O que começou com 500 empreendimentos cadastrados hoje conta com quase 1.700. No espaço, as empreendedoras fazem o cadastro dos produtos e serviços, e o consumidor pode fechar a venda na própria plataforma.

Quer debater assuntos de Carreiras e Empreendedorismo? Entre para o nosso grupo no Telegram pelo link ou digite @gruposuacarreira na barra de pesquisa do aplicativo. Se quiser apenas receber notícias, participe da nossa lista de distribuição por esse link ou digite @canalsuacarreira na barra de pesquisa.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.