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O progresso da China está matando o macarrão instantâneo

Redes de fastfood ganham o consumidor; Tingyi, maior fabricante chinês do produto, foi tirado do índice Hang Seng, de Hong Kong, após seus lucros com o macarrão caírem 60%

Por Adam Minter
Atualização:

Uma tigela de macarrão instantâneo grudento e afogado em molho não é exatamente um símbolo de vitalidade econômica. Mas durante os anos de boom econômico da China essas tigelas estavam tão presentes nos canteiros de obras quanto operários e guindastes. 

Não por acaso. Para milhões de trabalhadores chineses, o macarrão instantâneo (instant noodle) era a refeição mais prática. Encontrada em inúmeros pontos de venda, custava apenas alguns centavos. Assim, o mercado de instantâneo prosperou. Entre 2003 e 2008, as vendas anuais cresceram de US$ 4,2 bilhões para US$ 7,1 bilhões. 

Vendas de macarrão instantâneo na China caíram 6,75% neste ano Foto: Felipe Rau/Estadão

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Mas, com a desaceleração da economia chinesa, desacelerou-se também o apetite por macarrão instantâneo. Dias atrás, a Tingyi, maior fabricante chinês do produto, foi tirado do índice Hang Seng, de Hong Kong, após seus lucros com o macarrão caírem 60%. No total, as vendas de macarrão instantâneo na China caíram 6,75% neste ano, quarto ano consecutivo de declínio. 

O primeiro fator dessa queda é a demografia. A fabricação de macarrão instantâneo no país havia crescido paralelamente ao boom econômico, que estimulou a migração de mão de obra barata do campo para a cidade. Mas a população chinesa em idade de trabalho vem declinando desde 2010, e em 2015 a onda migrante caiu pela primeira vez em 30 anos. Com mais trabalhadores ficando em casa, o incentivo a comer uma tigela de macarrão pré-cozido tendia a cair – e caiu. 

Houve também a desaceleração econômica. Em 2015, as vendas de alimentos e produtos de consumo baratos chegaram ao nível mais baixo em cinco anos, segundo estudo divulgado em junho pela Bain. O declínio foi especialmente forte em produtos procurados por operários, como cerveja barata (queda de 3,5%) e macarrão instantâneo – fenômeno pelo qual a Bain responsabiliza a migração de empregos chineses para países de mão de obra mais barata. 

Mas o que é ruim para os fabricantes de macarrão instantâneo mostrou-se bom para outros. Salários mais altos melhoraram o padrão e a expectativa de vida de milhões de trabalhadores chineses. Basta visitar hoje uma fábrica para se constatar que as opções de comida são muito melhores. Com o número de empregados diminuindo, benefícios como melhor alimentação tornaram-se cada vez mais importantes para atraí-los. 

Os trabalhadores chineses também estão mais inclinados a gastar mais com as necessidades do dia a dia. Segundo pesquisa recente, metade dos consumidores agora procuram produtos “melhores e mais caros”. E uma tigela de macarrão instantâneo de US$ 0,25 não se enquadra aí. 

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Há ainda as preocupações com a saúde. Macarrões instantâneos criaram uma péssima reputação na China, em consequência de escândalos e rumores de um incidente de intoxicação alimentar em 2012. Vêm de longe as acusações de que o macarrão instantâneo está contaminado com plastificantes. Com ou sem base, escândalos não ajudam a reputação de um produto cheio de sal e conservantes. 

Mas, apesar de todos os problemas, o macarrão instantâneo tinha a vantagem da conveniência. Agora, mesmo essa vantagem perde atrativo. As ruas chinesas vivem cheias de motoqueiros e ciclistas dos dois sexos que entregam alimentos a preços competitivos com os de pontos de fast food. Em 2015, o sistema chinês de delivery faturou US$ 20 bilhões – uma alta de 55% em relação a 2014. Opções alimentares rápidas e saudáveis em domicílio estão acessíveis mesmo a estudantes e operários. 

Fabricantes e importadores chineses de macarrão instantâneo lutam para retomar o crescimento. Mas hoje enfrentam ainda a competição da Coreia do Sul, que tem uma reputação muito superior em termos de alimentação saudável. Uma opção seria exportar macarrão instantâneo para outras economias asiáticas emergentes, como o Vietnã, onde o consumo ainda está em alta, alavancado pelo crescimento do setor manufatureiro. Isso não resolveria o problema do encolhimento do mercado chinês de macarrão instantâneo, mas, com a nova classe de consumidores chineses, não se vislumbram opções mais atraentes. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ 

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