Especial para o Estado
Séries, filmes e quadrinhos foram responsáveis por colocar a Chico Rei, criada em 2008 em Juiz de Fora (MG), em destaque no cenário nacional de camisetas. Enquanto muitas empresas do ramo fecharam lojas físicas e confecções pelo País durante a crise, a empresa construiu uma ampla sede, com produção mensal de 25 mil peças. Foi lá que surgiu a inspiração para um selo de impacto social, o Camisetas Mudam o Mundo, criado neste ano.
A aposta vai na direção indicada por relatório de agosto do Ebit Nielsen, que mostra o público procurando cada vez mais “sentido e relevância na forma como consome”. Análise do grupo aponta que o tema sustentabilidade já está entre as três maiores preocupações para 32% dos brasileiros. De olho na responsabilidade socioambiental, marcas de camisetas como PanoSocial e Greenco também disputam o mercado.
Na Chico Rei, a criação do selo remete a 2015, quando a construção da sede alterou a rotina de bairro afastado de Juiz de Fora. Ao tomarem conhecimento da situação precária da escola do bairro, funcionários começaram um mutirão para reformar o espaço. Ali estava o DNA do Camisetas Mudam o Mundo, conta o diretor de marketing, Vitor Vizeu.
Dentre as propostas do selo está a doação de 5% a 10% do valor das vendas de todas as camisas para parceiros, como a APAE de São Paulo. Segundo Vizeu, a meta era crescer 13% neste ano, mas a empresa já registra alta de 23% em relação ao ano passado.
Além do selo, diz o diretor, o crescimento vem na esteira do reposicionamento da marca e da captação de parceiros. A maior parte das camisetas ainda é classificada na categoria “humor”, mas a empresa investe também em estampas estilizadas de artistas e celebridades do futebol e da música brasileira.
Para o consultor do Sebrae Bruno Zamith, num meio massificado como o da cultura pop, a estratégia do selo é um diferencial. “Se você tiver competidores com ofertas parecidas e um mostrar que tem uma pegada sustentável, ele provavelmente sai na frente da concorrência.”
Responsabilidade socioambiental
Além do formato de doação de parte das vendas, empresas adotam o modelo de dar emprego para reinserção social. Em São Paulo, a PanoSocial aposta na ressocialização de ex-presidiários sob a bandeira da “promoção da paz social”.
O foco é a produção de uniformes e camisetas lisas sobretudo para grandes empresas, mas algumas estampas próprias com temas como “igualdade animal” também estão disponíveis.
No começo, em 2014, a intenção era contar apenas com mão de obra egressa do sistema presidiário, mas a combinação com outros funcionários trouxe mais produtividade, diz o fundador, o austríaco Gerfried Gaulhofer.
“O investimento foi pequeno pelo potencial que a empresa tem. Começamos com R$ 170 mil”, afirma ele, que diz ter faturado R$ 900 mil no ano passado. A empresa aposta também em contratos com ONGs como Greenpeace e WWF. Agora, procura uma nova leva de parcerias para ampliar o negócio com pontos de venda físicos em capitais do País.
“É uma ajuda mútua, todas as empresas têm uma preocupação de mostrar que apoiam a causa, o que é justo”, vê Gaulhofer. “Não ajudamos ex-detentos, mas a sociedade, pois a reincidência é muito grande.”
No caso da mineira Greenco, o foco é o ambiente. Pioneira em moda sustentável, a empresa criada em 2007 traz para as estampas temas que estejam em alta entre os consumidores. Uma de suas camisetas que explica as diferenças entre espécies de abelha é a segunda mais vendida da marca, atrás apenas de uma com o tema meditação.
“Criamos uma sequência de estampas (de abelha) e depois só se falava disso. Quando virou trend, começamos a vender camisetas uma atrás da outra”, diz o sócio Cassius Pereira. Segundo ele, 1% de todas as vendas vão para um fundo destinado a organizações de impacto sustentável.
Para o negócio não parecer descolado da causa e receber críticas nas redes sociais, as empresas destacam o trabalho antes de lançar o produto. “Antes de lançarmos o selo (da Chico Rei), trabalhamos um ano na escola para podermos usar isso sem soar oportunista”, diz Vizeu.
Com a causa animal ganhando força, a V-Shirt vende camisetas apoiando os direitos animais e com o propósito de “criar estampas que promovam o debate sadio de ideias”. Com produtos mais amplos, mas também atuando no ramo de camisetas, a Vegano Shoes vende peças apostando no trabalho de ressocialização de ex-detentos.
O consultor do Sebrae reforça que o cuidado é fundamental. “A internet exige que o empresário esteja atento. Se houver alguma coisa negativa, e sempre há, você tem que estar pronto para responder. E rápido.”
A origem da matéria-prima
Uma das apostas do mercado de camisetas é o algodão 100% orgânico, de impacto ambiental menor que o comum e que chega a ser até 50% mais caro. É usado por Greenco, Vegano Shoes e PanoSocial. Mas, segundo a PanoSocial, a oferta brasileira da matéria-prima não supre a demanda, e a empresa tem de importar fios da Índia.
Outro insumo comum no setor é o PET reciclado, e as empresas apostam ainda em certificações 100% veganas (sem exploração animal), como faz a Chico Rei. Segundo Zamith, do Sebrae, para dar esse passo “a empresa tem de estar justa no planejamento”.
“Sustentabilidade não é só da natureza, é do negócio. Tem empresas que explicam as peças: para eu pagar uma costureira custa tanto, então não pode ser tão barato”, diz ele, referendando que há um público consumidor disposto a pagar o preço ao saber que o dinheiro está ajudando quem está na ponta.