01 de novembro de 2021 | 05h00
Não é novidade que as lives invadiram de vez a vida das pessoas. Segundo uma pesquisa do Business Insider, o Instagram registrou um aumento de 70% no uso desse recurso na plataforma desde o início da pandemia, em março de 2020. Mas o que começou a gerar burburinho agora e promete virar tendência é o live commerce, estratégia para vender durante as transmissões ao vivo pela internet.
A modalidade já é um fenômeno na China faz tempo. O Taobao, e-commerce do gigante Alibaba, faturou US$ 15,1 bilhões em vendas com esse formato em 2018. De 2019 para 2020, o live commerce teve uma alta de 229% no país asiático, batendo US$ 157 bilhões em compras online feitas durante transmissões ao vivo. Por aqui, a ideia já atrai grandes empresas como Americanas, Riachuelo, Renner e Dafiti, mas pequenos negócios também estão começando a aderir.
“Nós percebemos que o live commerce estava sendo executado por marcas nacionais e internacionais, com alta conversão de vendas”, fala Felipe Cercal, head de marketing da marca de skincare facial Creamy, que tinha apenas o e-commerce como canal de vendas. O negócio então se aproximou da startup StreamShop para ter acesso à estrutura da ferramenta e ao suporte técnico de quem já possuía a expertise desse mercado.
O executivo conta que as lives da marca comunicam os futuros lançamentos e usam como isca um cupom exclusivo de desconto para quem participar, além de conteúdo detalhado sobre os produtos. “A apresentação fica por conta do nosso especialista em pele, o dermatologista Luiz Romancini, que recebe uma influencer expert em skincare que já tenha testado o produto antes mesmo do lançamento”, acrescenta.
No caso da Zissou, empresa especializada em artigos do sono que já nasceu com DNA digital, a modalidade caiu como uma luva - e bombou. “Adoramos ser early-adopters de novas tecnologias. Já estávamos namorando o formato e acompanhando a movimentação e o sucesso fora do Brasil, principalmente na Ásia”, diz Ilan Vasserman, cofundador da marca. “Quando conhecemos a plataforma da Mimo Live Sales (leia mais abaixo), foi o casamento perfeito.”
A empresa já realizou duas lives, em julho e em outubro. “Em ambas atingimos nossas expectativas de audiência e as vendas foram o dobro do que faturamos em um dia normal”, conta o empresário. A primeira ação foi transmitida da Casa Zissou, loja conceito em São Paulo.
“Convidamos as influencers Karol Pinheiro e Máqui Nóbrega (na foto abaixo), que já conheciam nossos produtos. O foco foi apresentar a linha de produtos e transmitir ao público algo importante para nós, que é a experiência com a marca”, sublinha. A estreia contou com a tecnologia de realidade aumentada para que a audiência pudesse “testar” os produtos em casa.
Já na segunda edição, a empresa fez a transmissão a partir do Altar Flutuante, espaço que fica no meio da represa de Joanópolis (SP) e usa a linha de cama, colchões e travesseiros da marca nos quartos dos hóspedes. “A ideia de oferecer experiências exclusivas, em combos de produtos Zissou com diárias no Altar, foi outra forma de transmitir nossos valores”, afirma o empreendedor, que convidou a influencer Lala Rebelo, especializada em viagens, para comandar o show.
Para Fernando Figueiredo, dono da agência Bullet e cofundador da Pode Live Shop ao lado da agência Family, do apresentador Otaviano Costa, e da startup de tecnologia RocketBank, o sucesso do live commerce tem a ver com a mudança na mentalidade de consumo.
“Quando eu fundei a Bullet, 33 anos atrás, tinha um gap grande entre a hora em que você era impactado pelo comercial do produto na TV e a hora de comprar.” Ele conta que ficou maravilhado com o projeto de uma agência de Los Angeles que, ainda em 2016, fez uma parceria com o Walmart em que ela criava conteúdo, como vídeos de receita de 5 minutos, e já vendia os ingredientes e produtos necessários pelo e-commerce da rede. “Na época eu cheguei a apresentar a ideia para empresas aqui, mas só levei porta na cara”, brinca.
Quando veio a pandemia, ele viu que era o momento de resgatar a ideia. “Foi aí que me aproximei do Otaviano. Ele fazia muitas lives inteligentes que não tinham integração com e-commerce, mas eram precursoras da ideia.”
A estratégia da Pode foi fugir do modelo chinês de live commerce, que é de custo mais baixo, diz Figueiredo, e apostar em qualidade de produção, integração e entretenimento. “Pode ser a transmissão de um torneio de tênis de praia enquanto você vende artigos esportivos. Precisa entreter para poder vender”, ele frisa. “E temos a preocupação de trazer público em massa porque a taxa de conversão varia entre 7% e 10%.”
A empresa trabalha com quatro módulos de live: estúdio, mobile (na casa do influenciador, que pode ser o Otaviano ou outro), delivery (no ponto de venda do cliente, que pode ser um pequeno varejista) ou customizado de acordo com a vontade do cliente.
Monique Lima, CEO da Mimo Live Sales, conta que estava em quarentena no início da pandemia quando se perguntou como as pessoas fariam para continuar a interagir com as marcas. “A minha irmã tem uma marca de sapato, a Blue Bird Shoes, e fui fazer o teste de abrir uma live na loja dela”, lembra.
A primeira experiência não foi das melhores, mas ela conta que já tinha criado o e-mail da Mimo e a caixa de entrada ficou lotada de marcas querendo fazer lives. Ela pediu demissão do emprego e recebeu até investimento do ex-patrão para tocar a Mimo.
A lives da Mimo usam um sistema plug & play no site das próprias marcas. A empresa também oferece um curso de como vender via live, qual mix de produtos colocar, em que horário fazer, que influenciador é melhor para a marca e que gatilhos a transmissão deve ter, além de preparar um relatório analítico no final. “É um business de recorrência, quanto mais lives, melhor o resultado.”
Já a StreamShop, plataforma de live commerce do grupo Bittencourt, nasceu a partir de uma demanda da Dengo Chocolates, que procurou a empresa para elaborar uma nova forma de experiência ao vivo nas lojas.
“A ideia era reproduzir toda a experiência humana do varejo físico no ambiente digital”, fala Marcio Machado, CEO e fundador da plataforma. “O projeto todo ficou pronto em novembro de 2019, antes da pandemia, e acabou sendo uma forma inovadora para diversas marcas se manterem ‘abertas’, mesmo com as lojas fechadas.”
Agora a empresa também criou um formato 'one-to-one' (um para um), em que as marcas podem fazer o atendimento individual de clientes por meio de vídeo ao vivo, esclarecendo dúvidas e oferecendo produtos conectados diretamente ao e-commerce, e um shopping virtual batizado de LiveShop - um marketplace de lojas ao vivo que será inaugurado em novembro. “Teremos 50 lojas âncoras de diversos segmentos participando do shopping ao vivo”, ele revela. “Vai agregar tráfego para as marcas e conveniência para os consumidores, que encontrarão todas as lojas ao vivo em um só lugar.”
Segundo Marcio Machado, CEO da StreamShop
1. Construa uma audiência prévia à live
“Não adianta fazer um superevento sem ninguém para assistir. Então é preciso fazer um esforço de divulgação para a base de clientes e possíveis interessados na live para que ela seja um sucesso.”
2. Defina a estratégia para o evento
“Defina o catálogo de produtos que será oferecido, quais serão as promoções, as oportunidades de última hora e tudo o que envolve a dinâmica de venda.”
3. Escolha o apresentador
“O importante é o apresentador estabelecer a conexão com a audiência num tom de conversa, como se estivesse presente cara a cara com o consumidor. Uma pessoa que consiga engajar a audiência e ainda gerar interesse no que está sendo ofertado.”
4. Gere conteúdo relevante
“Ele precisa ser interessante e ao mesmo tempo divertido. No digital e no e-commerce, onde tudo fica muito parecido, a criação de conteúdo relevante é que vai separar quem vai ter a atenção do consumidor. Então foque em um bom roteiro e nos ensaios e na preparação do host.”
5. Tenha um olhar crítico
“Fique de olho nos produtos mais acessados, nas promoções que se esgotam mais rápido, nos momentos mais curtidos da live e também naqueles de menor engajamento para que você consiga planejar sua próxima ação e ter ainda melhores resultados”
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