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'Empreender exige resiliência', acredita Samir Iásbeck, CEO e fundador do Qranio

A dificuldade de se encaixar no modelo padrão de ensino fez o empresário criar uma startup com a missão de tornar o aprendizado divertido

Por Letícia Ginak
Atualização:

Samir Iásbeck sempre achou muito chato ir à escola e estudar. Mas o mesmo não se aplicava ao ato de aprender, coisa que sempre o fascinou. O incômodo com o padrão de ensino em sala de aula o acompanhou por toda a vida, inclusive na universidade. O empresário então decidiu resolver essa questão interna com a criação do Qranio, um aplicativo que abre as portas para o conhecimento e quebra a barreira da obrigatoriedade, transformando o aprendizado em algo divertido e que pode receber até recompensas. A startup brasileira surgiu em 2011, focada no segmento B2C, ganhando milhões de usuários no aplicativo em pouco tempo e, com isso, entrando para a lista do Google dos melhores aplicativos do ano em 2015. A transição para o segmento corporativo foi rápida e hoje a empresa tem o mercado B2B como foco para 2017 e 2018. Samir Iásbeck, um dos palestrantes da Semana Pró-PME, falou com o Estadão e compartilhou como foi criar o primeiro programa de milhagem de conhecimento do Brasil.

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:.Mais informações sobre a Semana Pró-PME.:

Conte um pouco sobre a sua trajetória como empreendedor e por que escolheu a educação como tema? É difícil começar a empreender em um ecossistema que fica fora de São Paulo. No meu caso, empreendi no interior de Minas Gerais, em Juiz de Fora, uma cidade que estava atrasada nove anos em startups comparada à São Paulo. No início, eu não sabia o que era startup também, não sabia o que era investidor anjo, nada disso. Mas eu tinha um propósito, que é até hoje a missão da Qranio: tornar o aprendizado divertido. Eu era uma criança que não gostava de ir para escola e de estudar, meu único propósito lá era a merenda.Mas eu amava aprender. Isso me acompanhou desde sempre. A ideia da Qranio surgiu em 2006, mas só lançamos o aplicativo em 2011. Eu peguei R$ 300 mil do meu bolso, que era tudo o que eu tinha, vendi um carro zero que eu tinha acabado de pagar a última parcela e coloquei tudo nesse projeto. O ato de empreender exige muita resiliência e foco. Você precisa de um propósito para continuar, porque fazer apenas pelo dinheiro não vai dar certo. Isso precisa estar na veia, senão você vai desistir.

Como foi esse processo de empreender em tecnologia no Brasil? Uma diferença que eu enxergo que temos do cenário norte-americano é que lá eles têm mais paciência. O Google mesmo, quando comprou o Youtube, foi pesquisar e montar uma estratégia para ganhar dinheiro com ele depois da compra. Eles apostam no mercado B2C por um período maior. O investidor brasileiro não tem paciência. Eu acho muito legal a expressão capital de risco sendo que o que eles menos querem correr é risco. Mas empreender no Brasil nesse segmento também tem suas vantagens, como uma mão-de-obra muito qualificada.

Qual é a maior lição que você pode dar sobre empreendedorismo? Eu comecei e ainda trabalho com a metodologia B.S., que é a metodologia do bom senso. Se eu não sei programar, eu vou procurar uma pessoa muito boa para fazer isso. O mesmo acontece se eu preciso de um bom design e não sei fazer. A minha responsabilidade no Qranio é vender. Eu sempre fui vendedor, desde criança. Eu já vi empreendedores com um projeto e produto ótimos em mãos, mas que não dão certo porque não foram vendidos. Você precisa vender a ideia para o investidor, por exemplo. Eu estou escrevendo um livro sobre isso, que provavelmente será lançado ano que vem. Eu vou transportar essa ideia para o aparelho digestivo. As pessoas pensam apenas na digestão, que é o resultado. Mas se você não se alimentar, não tem o que digerir. Vender é se alimentar.

Como foi mudar o mindset e o modelo da Qranio com o projeto consolidado e em andamento? O aplicativo era um sucesso, mas a gente precisa monetizá-lo. Em aplicativos que tem modo premium, mas que a versão gratuita funciona perfeitamente, o usuário não vê por que pagar por essa versão. E esse era o modelo do Qranio. A transição para o mercado B2B foi mais uma demanda que as empresas nos trouxeram do que uma mudança que veio de dentro. Nosso primeiro cliente foi o Bob’s, que nos pediu para criar um modelo novo para o treinamento interno dos funcionários. Depois disso, o Bradesco nos procurou e aí eu pensei: uma das maiores empresas brasileiras que investe em treinamento corporativo no Brasil veio atrás da gente, então acho que temos uma falha de mercado. E eu até fiquei bravo comigo mesmo, porque sou o vendedor da Qranio e não tinha percebido isso ainda. Foi então que começamos a focar no B2B. Fui estudar e vi que os treinamentos corporativos ainda são feitos de maneira muito antiquada, em formato desktop, limitando o funcionário. Com esse novo mindset, nós criamos uma plataforma específica para cada cliente, um software para cada um, com as necessidades que eles precisam. Nós tiramos os funcionários do inferno e os levamos para o céu.

O formato B2C permanece? O formato B2C continua porque ele é a nossa vitrine, ele mostra todo o nosso potencial. Mas nosso plano para 2017 e 2018 é foco 100% no comercial, queremos evoluir ainda mais a plataforma corporativa. O retorno financeiro do formato B2C chega em cinco ou sete anos. Hoje, eu não preciso mais de investidor. Está tudo equalizado, sustentável economicamente.

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E depois de alguns anos empreendendo em educação, qual é a sua visão sobre o modelo de ensino tradicional que seguimos? Eu acho que a gente tem que repensar os modelos. Um dia, em uma palestra, me perguntaram se eu sou contra os livros. Pelo contrário. Mas nós vivemos em um mundo multimídia e as pessoas ainda querem escolher apenas uma mídia para transmitir conhecimento. Não tem mais como ficar em um modelo em que o professor é o único detentor do conhecimento, em que você tem que sentar na sala de aula e apenas ouvir o que ele tem a dizer. E o paradoxo da sala de informática? Os alunos não precisam mais da sala de informática porque eles levam o computador no bolso, que é o celular. E então ele entra na sala de aula e a primeira coisa que o professor pede é para que ele desligue o celular. Olha esse paradoxo. O professor hoje tem que ser um facilitador do conhecimento, ajudar a mostrar os caminhos. Eu admiro muito a profissão e acho que ela ainda é uma das mais importantes da sociedade, mas esse modelo tem que mudar. A tecnologia chegou para democratizar o conhecimento.

Já pensaram em parcerias com instituições de ensino? Já realizamos um projeto com uma faculdade particular, mas por questões institucionais o projeto não foi para frente. E, para fazermos algo com a rede pública, sabemos que precisa participar de licitações. Hoje nosso foco é mesmo o corporativo.

Vocês participaram de um programa de aceleração do Google, o Launchpad Accelerator. Como foi a sua experiência no Vale do Silício e quais as diferenças que identificou em relação ao mercado brasileiro? Olha, a Califórnia também não é os Estados Unidos inteiro. Às vezes uma cidadezinha do interior do Texas também pode ter sérios problemas para os empreendedores em tecnologia. O que eu percebi lá é que o cara da carrocinha de cachorro-quente consegue conversar sobre empreendedorismo com qualquer especialista. Acho que o maior atraso do Brasil é que não temos um ecossistema. Mas também acho que nós precisamos entender que o ecossistema fica lá e que nós podemos fazer a nossa parte por aqui. É exatamente isso o que eu penso com o Qranio. Não adianta eu montar o Vale do Silício em Juiz de Fora. E eu tenho as minhas vantagens aqui também. Eu tenho uma mão-de-obra altamente capacitada que custa 1/5 da de São Paulo, por exemplo. O Brasil tem empreendedores e programadores muito bons. Você já percebeu que sempre tem um brasileiro envolvido em grandes projetos? Tem no Facebook, no Instagram. Eu fui convidado para participar do Google Experts na área de estratégia de produtos e novos produtos digitais e, nesse grupo de 30 pessoas, tem quatro brasileiros. O Brasil tem muita força, nós temos muita qualidade em tecnologia. 

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