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Empreendedores dão exemplo de criatividade em setores mais impactados

Segmentos como cinema, restaurantes e eventos sofrem com falta de contato social, mas donos de negócios mostram resiliência para inovar e até expandir na pandemia

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Por Bianca Zanatta
Atualização:

Depois da retomada gradual no faturamento ao longo do segundo semestre de 2020, as pequenas e médias empresas voltaram a ser atingidas pela nova onda da pandemia do coronavírus, registrada no início de 2021. De acordo com a 10ª edição da pesquisa “O Impacto da Pandemia do Coronavírus nos Pequenos Negócios”, do Sebrae em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), a recuperação vinha estável desde abril - momento mais agudo da crise, quando o faturamento dos negócios despencou em 70%. 

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Agora, com nova alta nas restrições de circulação, os resultados voltaram ao patamar de agosto do ano passado, em que a perda média foi de 40%, mostra a pesquisa. Entre os entrevistados, 57% afirmam que estão com muita dificuldade para manter seus negócios.

A economia como um todo sofreu o baque, mas empresas de setores mais afetados, como o comércio não essencial (que inclui bares e restaurantes) e os segmentos de audiovisual e de eventos, abalados pela falta de contato social, tiveram que se reinventar por completo para sobreviver ao abre-e-fecha. 

Se na primeira onda o desespero predominou, no entanto, agora a experiência fala mais alto. “Quando a pandemia estourou eu tomei a decisão de não abrir o restaurante antes mesmo do decreto e fiquei uma semana quebrando a cabeça sozinho, pensando em como nos manter em pé”, relata o chef Luiz Filipe Souza, que comanda o restaurante italiano Evvai e a hamburgueria Fat Cow, em São Paulo.

André Sturm numa sala vazia de cinema do Belas Artes: empenho para não decretar fechamento de negócios e diversificar atuação na crise. Foto: Werther Santana/Estadão

Para ele, o maior desafio era transferir o alto nível técnico da cozinha do Evvai para uma caixinha de delivery. “Parecia impossível”, lembra. Mas a “bugada”, segundo o chef, foi rápida. A primeira iniciativa foi deixar o menu-degustação de lado por um tempo e eleger pratos com perfil mais afetivo e que viajassem bem. 

Souza descobriu que vinha vivendo sob regras muito rígidas na casa. “Foi possível a gente se permitir fazer coisas novas e até se livrar de alguns pesos desnecessários”, explica o chef, que chegou a incluir no delivery um paillard da infância e o estrogonofe que cozinhava para os funcionários. 

Depois de alguns meses, já amadurecidos e movidos pelo desafio, ele e a equipe decidiram encarar de novo a ideia do menu-degustação na caixa. O resultado foi o Expresso Oriundi, que leva à casa dos clientes uma linha do tempo com sete ícones do Evvai. 

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A reinvenção não parou por aí. Souza aproveitou a expertise recém-adquirida no delivery para inaugurar, em plena pandemia, a pizzaria Evv.ita e o Fast Cow - espécie de irmão caçula da hamburgueria Fat Cow, com menu mais enxuto e acessível. Ele abriu ainda o Mercato Evvai, e-commerce de rotisseria, vinhos e itens de pequenos produtores que abastecem o restaurante.

“Foi uma forma de manter vivos os fornecedores que precisavam escoar a produção e não tinham contato com o cliente final ”, afirma o chef, que também armou uma linha de frente para reforçar a renda dos funcionários. A loja online Blue Cookie, com biscoitos que ele preparou despretensiosamente em uma tarde da pandemia, tem todo o lucro revertido para os funcionários, como forma de substituir a gorjeta que deixaram de receber.

“É um pessoal que arregaçou as mangas e se expôs a riscos para ajudar”, diz o empreendedor, que viu a relação mudar com a iniciativa. “Eles se sentiram incluídos e mais motivados.”

O chef de cozinha Luiz Filipe Souza, do restaurante Evvai, deixou o menu-degustação de lado por um tempo para apostar em pratos que viajassem bem no delivery. Foto: Tadeu Brunelli

Luz, câmera e muita ação

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Quase um ano antes da chegada da pandemia, o cineasta André Sturm, que dirige o Petra Belas Artes, já tinha passado por um momento difícil. Ao perder o patrocínio da Caixa Econômica Federal, o cinema - um dos mais antigos de São Paulo - teria que fechar as portas. Foi a entrada da cerveja Petra como patrocinadora que mudou a situação. 

Quando a pandemia veio para fechar as portas de todos, porém, Sturm soube agir rápido. “O cinema tem dois custos principais, que são o aluguel e a mão de obra”, explica. “No médio prazo, não teríamos recursos para manter.”

A primeira iniciativa foi fazer o crowdfunding Belas Artes Meu Amor, que tinha meta de arrecadar R$ 10 mil e alcançou mais de R$ 60 mil em doações, dando fôlego para pagar a equipe, enquanto a Petra arcava com o aluguel do espaço. “Depois fui atrás do governo do Estado para conseguir montar um drive-in a céu aberto, que seria uma boa saída para o momento de distanciamento social”, conta. 

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A ideia deu certo e um decreto liberou a modalidade. O Belas Artes Drive-in, que ocupou o Memorial da América Latina em junho e julho de 2020, exibiu 36 filmes em 65 sessões. “Foi o drive-in de maior público do Brasil”, diz Sturm. “Olhamos para trás para poder ir para a frente.”

E teve também um olhar para o presente. O streaming Petra Belas Artes À La Carte surgiu no final de 2019, mas era ainda uma versão beta, com lançamento programado para abril de 2020. “Foi a coisa boa dentro da coisa ruim”, fala o cineasta, que ofereceu gratuidade no primeiro mês de assinatura, quando todos estavam em casa, batendo 1,1 milhão de acessos. 

O streaming tem um custo alto e precisou de investimentos iniciais, mas hoje já é autossuficiente. “É também um jeito de manter o conceito do bom cinema vivo e proativo.”

No guarda-chuva do Belas Artes Grupo, que foi oficializado em julho, tem ainda a distribuidora Pandora Filmes e a Petra Belas Artes Digital, plataforma gratuita lançada esta semana no Youtube com conteúdo sobre os bastidores do audiovisual. 

“A lição que tirei é que não dá para ficar esperando ajuda, tem que ir atrás e resolver os problemas”, afirma Sturm, que também precisou aprender a hora de dizer “chega”. Primeiro cinema a reabrir as portas quando houve a flexibilização, o Petra Belas Artes, nessa nova onda de fechamento, só voltará a operar quando a vacinação estiver em estágio avançado. “É uma situação dialética porque posso garantir que meu cinema é 100% seguro, mas não posso falar o mesmo da porta para fora”, ele justifica.

Kit de presente feito por Adriana Malouf, que trabalha com cenografia de eventos e viu sua receita ir a zero com o começo da pandemia. Foto: Acervo pessoal

Delivery de festa na caixa

Indo de vento em popa no começo de 2020, com agenda fixa de eventos corporativos e festas particulares fechadas, a empresária Adriana Malouf, que trabalha com decoração, cenografia e arquitetura de eventos, conta que ficou arrasada no começo da pandemia, com seu setor sendo um dos mais afetados

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“A maioria preferiu não cancelar, mas quando teve que adiar pela segunda ou terceira vez acabou desistindo”, relata. Da média de três eventos por mês ela foi para o zero. “Fiquei em choque”, lembra a empresária. 

Foi quando a cunhada dela falou que a mãe ia completar 70 anos e pediu que fizesse uma caixa de presente, já que não poderiam comemorar a data juntas por conta do isolamento. “Era um jeito de aquecer o coração numa fase tão difícil”, afirma Malouf. E esse foi o pulo do gato para ressignificar o negócio. Além dos kits de presentes, que trazem itens como flores, chocolates e balões personalizados, a empresária também lançou a Festa na Caixa, em que cada “convidado virtual” recebe sua caixa personalizada e a festa acontece pelo Zoom. 

A demanda é variada, de festas infantis a comemorações corporativas. “Comecei a trabalhar como louca e até chamei a empresa de transportes dos tempos de eventos para fazer as entregas”, ela comemora. 

Os kits vão se tornar um braço definitivo da empresa, segundo a empresária. “Criei um networking importante e fiz muitos contatos novos, para quem divulgo inclusive meu trabalho anterior, que pretendo retomar quando tudo voltar”, fala. “Mas minha área foi a primeira a parar e com certeza vai ser a última a retomar. A criatividade está sendo fundamental, tanto na minha vida pessoal quanto profissional.”

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