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Consumidores empoderados exigem empresa afiada nas redes sociais

Desafio é entender que boicotes extrapolam produtos e contestamo posicionamento das marcas, diz especialista

Por Mateus Apud
Atualização:

Cada vez mais conectado nas redes sociais, o mercado viu aumentar o número dos chamados consumidores empoderados e, com eles, reclamações e boicotes contra marcas têm se tornado processo mais comum e de rápida resposta.

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Um exemplo foi quando a Farm, grife carioca de moda, divulgou coleção no ano passado com estampa que retratava o Brasil no século 19, com mulheres e homens negros, e foi vista como racista.

Após reclamações, a Farm pediu desculpas: “Ficamos tristes com a repercussão negativa. (...) Estamos retirando as peças do nosso site e lojas. Pedimos desculpas a todos”, publicou a marca no Facebook, em julho de 2017.

Negros. Estampa da marca carioca Farma, vista como racista. Reprodução Foto: Reprodução

Nesse novo contexto, tornou-se fundamental as empresas apresentarem um posicionamento claro e uma equipe afiada de marketing, pois a resposta a casos como esses pode até piorar a situação.

Para o professor de comportamento do consumidor da ESPM-SP Fábio Mariano, muitas empresas ainda sofrem com boicotes, pois existe uma “cegueira” dos profissionais de marketing. Elas não entenderam, diz ele, que as reclamações não são mais sobre um produto, mas sobre o posicionamento da marca. “Estamos na época da transparência. Nunca foi tão essencial se posicionar.”

Dados da pesquisa “O varejo na era do consumidor empoderado”, da Euromonitor Internacional, divulgada em setembro, apontam que 26% dos consumidores no mundo já são classificados como empoderados e estão mudando o varejo.

A publicitária Liana Rangel é exemplo de consumidora empoderada, que faz questão de se posicionar nas redes sociais. Inspirada no livro Sem Logo, de Naomi Klein, a ativista começou a fiscalizar marcas e diz que não pretende aliviar. “Entendo meu poder como consumidora”, diz Liana, que mudou hábitos de consumo observando o posicionamento de empresas. “Admito erro em questão de produto mal lançado, mas não dá pra aceitar o posicionamento da marca como um todo.”

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Fenômeno social

O boicote a marcas não é uma prática recente – há casos registrados desde o século passado na Europa. O que mudou de lá para cá, explica Fábio Mariano, foi o advento das redes sociais, que possibilitaram maior engajamento. “Quem sempre disse para o consumidor que ele é rei foi a empresa e, hoje, ele entendeu isso e assumiu o reinado.”

O professor ressalta que, no Brasil, o boicote sempre foi mascarado como atitude de quem está certo. “Historicamente, ficou essa visão de consumidor bonzinho e empresa do mal, mas nem sempre é assim. As redes sociais mostram que o boicote é uma ferramenta usada por qualquer um dos lados.”

Boicote inverso.No Dia dos Pais, o Boticário reagiu a críticas de racistas. Foto: Reprodução Foto: Reprodução

Casos de quando a empresa refuta o preconceito do consumidor foram protagonizados pelo Boticário. Neste ano, a marca lançou campanha para o Dia dos Pais que narra a história de uma família negra. Em 2015, a campanha para o Dia dos Namorados retratava casais gays. Nos dois casos, a marca sofreu boicote de conservadores, mas reafirmou a posição de que seus produtos são para todos – e transformou ataques em vendas.

Para o professor da ESPM, mesmo as pequenas empresas têm de nascer preparadas para responder aos consumidores, ou ao menos se preparar antes de lançar campanhas. 

“Primeiro, é preciso contratar uma equipe de mídias sociais competente, qualificada e alinhada com as pautas atuais. Segundo, dar autonomia, liberdade e poder para essa equipe. Terceiro, entender que grande parte das reclamações não se referem a um produto e, sim, a pautas sociais, como objetificação da mulher, desrespeitos racial e à comunidade LGBT.”

Orgulho LGBT.Carteira com material que imita papel da marca gaúcha Dobra. Foto:Ana Clara Schuller Foto: Ana Clara Schuller

Criada em 2016, a gaúcha Dobra é uma dessas empresas que, mesmo de pequeno porte, estão preocupadas com a imagem.

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Especializada em carteiras e tênis com material que imita papel, levanta a bandeira LGBT e da diversidade desde o começo das atividades, conta o sócio-fundador Eduardo Seelig. 

“A Dobra existe por um propósito maior e não só para vender um produto.” Ainda assim, a empresa recebe ataques de um público mais conservador. “Se a pessoas não querem comprar por isso, tudo bem, mas não vamos deixar de nos posicionar.”

*Estagiário sob supervisão do editor de suplementos, Daniel Fernandes 

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